Cabo Suspenso




PROBLEMA 1. Consideremos o problema de determinar a forma assumida por um cabo homogêneo flexível, suspenso pelas duas extremidades, sob a ação de seu próprio peso.



     \begin{picture}(200,180)

\put(10,30){\line(1,0){180}}

\put(67,10){\line(0,1){1...
...
\put(67,51){\vector(-1,0){50}}

\qbezier(10,100)(66,-15)(170,140)
\end{picture}           

Solução:

Evidentemente, quando atingir o equilíbrio, o cabo vai ficar, todo ele, contido em um plano, o plano vertical que passa por suas duas extremidades. Ficamos, então, com um problema no plano. Coloquenos, neste plano, um sistema de coordenadas em que o eixo $ Y$ seja vertical e passe pelo ponto mais baixo $ (0,y_0)$ do cabo. A força de tensão é variável ao longo do cabo. A tensão em um ponto $ P$ do cabo depende, entre outras grandezas, do peso da porção de cabo acima do ponto $ P$. Consideremos um trecho do cabo, de comprimento $ s$, entre o ponto de coordenadas $ (x,y)$ e o ponto mais baixo do cabo.
Este trecho está em equilíbrio sob a ação de 3 forças: o seu peso, a tensão $ T_0$ no ponto mais baixo e a tensão $ T$ no ponto mais alto. O fato do cabo ser flexível se expressa matematicamente dizendo que a força de tensão tem sempre a direção tangente à curva. Isto, porque não há forças internas, o cabo não oferece nenhuma resistência a curvar-se na direção da tensão. A soma destas 3 forças que agem sobre o trecho considerado do cabo é nula. Considerando as componentes horizontais, temos

$\displaystyle T_0=T\,\cos\theta$ (1)

e, igualando a componentes vertical de $ T$ ao peso do trecho, temos

$\displaystyle T\,{\rm sen}\,\theta=\lambda\,g\,s \ ,$ (2)

onde $ \lambda$ é a densidade linear do cabo. Dividindo (2) por (1), obtemos

$\displaystyle \tan\theta=\frac{\lambda\,g\,s}{T_0} \ .$ (3)

Estamos procurando a função $ y=y(x)$ que dá a forma assumida pelo cabo. A condição (3) nos diz que

$\displaystyle \frac{dy}{dx}=\frac{\lambda\,g\,s}{T_0} \ .$ (4)

Note que $ s=s(x)$ é função de $ x$. A igualdade acima não é ainda uma EDO, pois 3 variáveis estão envolvidas. Para superar esta dificuldade, derivamos (3) em relação a $ x$,

$\displaystyle \frac{d^2y}{dx^2}=\frac{\lambda\,g}{T_0}\,\frac{ds}{dx} \ .$ (5)

Vamos aqui abrir um parênteses para revisar uma fórmula do cálculo, a fórmula (6) abaixo.


      \begin{picture}(200,170)

\put(10,15){\line(1,0){160}}

\put(30,0){\line(0,1){14...
...}

\put(90,65){\mbox{$\Delta s$}}

\qbezier(18,50)(80,20)(140,100)
\end{picture}           



A figura ao lado mostra um pequeno segmento de comprimento $ \Delta x$ a partir do ponto $ x$. Queremos expressar o pequeno comprimento de arco $ \Delta s$, medido sobre a curva. A idéia é aproximar $ \Delta s$ pelo comprimento medido sobre a reta tangente. Chamando de $ \theta$ o ângulo entre esta tangente e o o eixo $ X$, temos

$\displaystyle \Delta x\approx\bigl(\Delta s\bigr)\cos\theta \ .
$

Logo

$\displaystyle \frac{\Delta s}{\Delta x}\approx\frac{1}{\cos\theta}=
\sec\theta=\sqrt{1+\tan^2\theta} \ .
$

Fazendo $ \,\Delta x\longrightarrow 0\,$, obtemos

$\displaystyle \frac{ds}{dx}=\sqrt{1+\biggl(\frac{dy}{dx}\biggr)^2}$ (6)

Substituindo (6) em (5), obtemos

$\displaystyle y''=\frac{\lambda\,g}{T_0}\,\sqrt{1+\bigl(y'\bigr)^2} \ ,$ (7)

que é uma EDO de segunda ordem redutível à primeira ordem. Chamando $ \,z=y'\,$, temos

$\displaystyle \frac{dz}{dx}=a\,\sqrt{1+z^2} \ ,$ (8)

onde $ \displaystyle\,a=\frac{\lambda\,g}{T_0}\,$. A EDO (8) é separável. Separando as variáveis e integrando, temos

$\displaystyle \int\frac{dz}{\sqrt{1+z^2}}=a\int dx \ .
$

Fazendo a substituição $ \,z=\tan t\,$, $ \,dz=\sec^2 t\,dt\,$,

$\displaystyle \int\frac{dz}{\sqrt{1+z^2}}=\int\frac{\sec^2 t\,dt}{\sec t}=
\int\sec t\,dt
$

$\displaystyle =\ln\left\vert\tan t+\sec t\right\vert
=\ln\left\vert z+\sqrt{1+z^2}\right\vert \ .
$

Logo

$\displaystyle \ln\left\vert z+\sqrt{1+z^2}\right\vert=a\,x+C_1
$

Usando que a tangente no ponto mais baixo da curva é horizontal, isto é, $ \,z(0)=y'(0)=0\,$, deduzimos que $ \,C_1=0\,$. Logo

$\displaystyle \ln\left\vert z+\sqrt{1+z^2}\right\vert=a\,x \ ,
$

ou seja,

$\displaystyle z+\sqrt{1+z^2}=\pm e^x \ .
$

Se nos concentrarmos no lado direito do cabo, onde $ z=y'>0$, temos

$\displaystyle z+\sqrt{1+z^2}=e^{a\,x} \ .
$

Podemos isolar $ z$,

$\displaystyle \sqrt{1+z^2}$ $\displaystyle =$ $\displaystyle e^{a\,x}-z$  
$\displaystyle 1+z^2$ $\displaystyle =$ $\displaystyle e^{2\,a\,x}-2\,z\,e^{a\,x}+z^2 \rule{0.cm}{0.6cm}$  
$\displaystyle 1$ $\displaystyle =$ $\displaystyle e^{2\,a\,x}-2\,z\,e^{a\,x} \rule{0.cm}{0.6cm}$  
$\displaystyle z$ $\displaystyle =$ $\displaystyle \frac{e^{2\,a\,x}-1}{2\,e^{a\,x}x}=\frac{e^{a\,x}-e^{-a\,x}}{2}\rule{0.cm}{0.8cm}
\ \ .$  

Logo

$\displaystyle y'=\frac{e^{a\,x}-e^{-a\,x}}{2} 
$

e

$\displaystyle y=\frac{e^{a\,x}x+e^{-a\,x}}{2\,{a\,x}}+C_2=\frac{1}{a}\cosh(a\,x)+C_2
\ .
$

Concluímos que a posição de equilíbrio do cabo é dada por

$ ay=\cosh(a\,x)+C_2$


isto, é, uma translação vertical da curva $ ay=a\,\cosh(a\,x)$, que nada mais é do que uma mudança de escala (uma ampliação ou redução) da curva

$\displaystyle y=\cosh x \ ,$ (9)

já que provém dela através da tranformação $ \;(x,y)\longmapsto(a\,x,a\,y)\,$.


                     
A curva $ y=\cosh x$ chama-se catenária, do latim catena, que significa cadeia ou corrente. A catenária (9), portanto, é a forma assumida por um cabo flexível suspenso, a menos de um fator de ampliação ou redução.


      \begin{picture}(140,150)

\put(10,30){\line(1,0){120}}

\put(30,10){\line(0,1){1...
...$}}

\qbezier(40,80)(70,65)(100,80)

\qbezier(40,80)(70,5)(100,80)
\end{picture}           

Fixados 2 pontos $ A$ e $ B$ como na figura ao lado, consideremos 2 cabos flexíveis de comprimentos diferentes suspensos por estes 2 pontos. A forma assumida pelo cabo de menor comprimento, que ficou mais acima é a de um pequeno trecho da catenária (9), bem próximo ao ponto mais baixo, submetido a uma grande ampliação. Já a forma assumida pelo cabo de maior comprimento é a de um trecho muito mais longo da catenária (9), sujeito a uma pequena ampliação ou até mesmo a uma redução.



PROBLEMA 2. Determine a forma assumida por um cabo de sustentação de uma ponte pênsil de densidade horizontal constante, supondo a massa do cabo desprezível face a massa da ponte que ele sustenta.

Solução:


Consideremos, novamente na Figura 1, as 3 forças agindo no trecho do cabo entre seu ponto pais baixo e o ponto $ (x,y)$. A única diferença é que agora em lugar de considerar o peso do techo de cabo, devemos considerar o peso do trecho da ponte que esta sob o trecho do cabo. Em outras palavras, a condição (1) continua a mesma, mas em lugar de (2) devemos considerar agora a condição

$\displaystyle T\,{\rm sen}\,\theta=\lambda\,g\,x \ ,$ (10)

onde $ \lambda$ designa agora a densidade horizontal da ponte.

Dividindo (10) por (1),

$\displaystyle \tan\theta=\frac{\lambda\,g\,x}{T_0} \ .$ (11)

Logo a função $ y=y(x)$ que dá a forma do cabo satisfaz a equação diferencial

$\displaystyle \frac{dy}{dx}=\frac{\lambda\,g\,x}{T_0} \ .
$

Trata-se de uma equação diferencial de primeira ordem separável muito simples, cuja solução geral é

$\displaystyle y=\frac{\lambda\,g\,x^2}{2\,T_0}+C \ .
$



CONCLUSÃO: Um cabo de sustentação de uma ponte pênsil assume a forma de um arco de parábola.



Eduardo H. M. Brietzke